Crítica: O Ninho


É muito louvável quando uma produção – seja do qualquer esfera, cinematográfica, televisiva ou literária – consegue surpreender seu público. Ainda mais porque existe uma nítida sensação de que o fio da criatividade parece cada vez mais frágil no que diz respeito à criação de novas obras ficcionais.

Dirigido por Roberto De Feo, que também assina o roteiro junto a Lucio Besana e Margherita Ferri, “O Ninho” (Il Nido / The Nest) tem o mérito de parecer óbvio na maior parte de seus 107 minutos de duração, quando, na verdade, tem uma das reviravoltas mais interessantes – e inimagináveis – dos últimos tempos.

A trama gira em torno da rotina de Samuel (Justin Korovkin) e sua mãe Elena (Francesca Cavallin). O garoto de 13 anos sofre de uma paraplegia diagnosticada como irreversível pelo médico da família, Dr. Christian (Maurizio Lombardi) – este, o personagem mais perturbador do suspense italiano.

Vivendo no Castelo dei Lagh – uma mansão isolada de quase tudo / todos -, a dupla tem contato apenas com os funcionários, que seguem rígidas normas para lá se manterem, incluindo uma estranha proibição em citar qualquer coisa do “mundo exterior” às delimitações do terreno em que se localiza a residência.

O jovem protagonista passa seus dias nessa espécie de sociedade particular, tendo aulas com a própria mãe, escutando apenas música clássica e aprendendo como ser o futuro mantenedor do local.

Uma reflexão feita em dado momento do longa resume o que se pode esperar: “Não importa o quão protegidos e amados sejamos. É o que não podemos mais ter que nos atormenta”.

Tal impressão de vazio em Samuel (embora cercado de bens materiais e pessoas que o tratam cordialmente) se amplifica com a chegada de Denise (Ginevra Francesconi), jovem de 15 anos, que trabalhará como empregada na casa e será responsável por questionamentos nunca antes feitos pelo garoto, que até este ponto parecia aceitar sua realidade tão limitada.

Ao término da exibição – e depois de tentar absorver o que acontece nos momentos finais – a sensação que fica é que durante toda a narrativa são dadas pistas. Algumas quase imperceptíveis, outras mais claras, mas que conduzem o espectador a conclusões equivocadas.

O que me pareceu beirar o repetitivo e já visto em várias obras do gênero, na verdade era apenas a ponta de um iceberg muito maior, que só é apresentado quando a história está praticamente concluída. E isso é, no mínimo, impactante.

Os destaques positivos ficam para os detalhes de “O Ninho”: a luminosidade que traz para o público, o inevitável incômodo de quem vive na mansão; os ângulos de enquadramento, que aumentam a sensação de cárcere; os vários closes nos personagens e objetos, que conseguem limitar nosso olhar, enquanto aumenta nossa dúvida.

A trilha sonora inclui “Moonlight Serenade”, de Beethoven (cuja execução é sempre um presente para os ouvidos), “The Thieving Mappie (Abridged)”, de Rossini (tocada em momentos bastante perturbadores da produção) e uma magnífica versão para piano de “Where is my Mind”, de Pixies.

É importante mencionar que há sequências muito explícitas envolvendo assuntos que podem ser incômodos para parte do público. Esse, talvez seja o meu único questionamento, pois penso se optar por sutilezas e silhuetas não teria sido um caminho menos chocante (e ainda assim, assustador).

Vale conferir.

por Angela Debellis

Crédito das fotos: Loris T. Zambelli.

*Texto originalmente publicado no Site A Toupeira.