Crítica: A Mulher no Jardim

Dirigido por Jaume Collet-Serra — conhecido pelo trabalho em “Adão Negro” (2022) e “Bagagem de Risco” (2024), da Netflix — “A Mulher no Jardim” (The Woman in the Yard) marca um ponto de inflexão em sua carreira ao abraçar um terror psicológico mais intimista. Com roteiro do estreante Samuel Stefanak, o filme se afasta das fórmulas tradicionais do gênero para entregar uma narrativa densa sobre luto, trauma e saúde mental.

A história se passa em uma casa no interior, onde Ramona (Danielle Deadwyler) e sua família enfrentam a recente perda do patriarca David (Russell Hornsby). A tranquilidade do local é abalada quando uma figura misteriosa, uma mulher vestida de preto (vivida por Okwui Okpokwasili), aparece no jardim e passa a rondar silenciosamente os moradores. O clima de tensão cresce à medida que essa presença enigmática parece ameaçar a estabilidade emocional da família — especialmente, de Ramona.

Embora o enredo pareça simples à primeira vista, “A Mulher no Jardim” aposta na construção gradual do suspense e em uma atmosfera carregada, mais próxima do desconforto psicológico do que dos sustos fáceis. Pode surpreender (ou frustrar) espectadores que esperam um terror convencional, pois sua proposta caminha na direção de uma fábula melancólica sobre o impacto do luto e o esfacelamento interno de quem fica.

O roteiro, apesar de apresentar momentos de repetição e certa lentidão a partir da metade do longa, compensa essas fragilidades ao entregar, ao final, uma revelação simbólica e emocionalmente potente. A figura da mulher de preto deixa de ser um simples elemento de ameaça externa e passa a representar algo muito mais profundo e subjetivo — uma alegoria clara da dor que silencia, assombra e paralisa.

Danielle Deadwyler, que também atua como produtora, é o grande destaque. Sua performance é contida e poderosa, carregando a dor de sua personagem nos gestos, nos silêncios e nos olhares. Entrega uma atuação multifacetada, transitando entre o medo, a exaustão e a desesperança, sem jamais perder o controle da personagem. Sua presença dá à produção a força emocional que o roteiro nem sempre sustenta por si só.

A interação entre o elenco também merece elogios. A dinâmica familiar é crível e bem trabalhada, o que aumenta o peso das tensões quando a figura do jardim começa a interferir na rotina dos personagens. A direção de Collet-Serra mostra-se eficiente ao explorar o espaço doméstico como um palco de inquietações internas, e a fotografia colabora para manter a sensação de aprisionamento e desconforto.

No fim, “A Mulher no Jardim” é menos um filme de terror e mais um estudo sobre os efeitos do luto e da depressão. Sua alegoria sobre saúde mental é sutil, mas comovente — e o desfecho, ainda que possa ser devastador para alguns, carrega uma sensibilidade rara em produções do gênero. Trata-se de uma obra que exige paciência, mas que recompensa o espectador atento com uma mensagem profunda e atual.

por Artur Francisco – especial para CFNotícias

*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Universal Pictures.