Crítica: Uma Dobra no Tempo


Uma Dobra no Tempo propõe uma jornada pelos olhos de uma heroína juvenil. Com o pai sumido, a garota Meg recebe o chamado dele, por meio de três excêntricas mulheres, para percorrer o universo e descobrir onde ele está. Assim, os irmãos Meg (Storm Reid) e Charles Wallace (Deric McCabe), com o colega Calvin (Levi Miller), enfrentam as etapas de desafio para chegar na fonte de energia maligna do universo.

Dirigido por Ava DuVernay, este é um filme de gênero distinto da cinebiografia Selma, indicado ao Oscar 2015, com a direção de DuVernay. A proposta é dar visibilidade à protagonista juvenil negra ao mesmo tempo em que é dirigido por uma mulher e adaptado da obra homônima de Madeleine L’Engle. Este é um ponto positivo, mas que acaba sendo enfraquecido por sua qualidade razoável e por tudo o que ele ainda podia oferecer.

O grande problema de Uma Dobra no Tempo é que ele não se esforça, de nenhuma forma, em apresentar informações válidas sobre o universo que propõe. Sendo ele uma trama de ficção científica, não concede nada sobre Física. No livro adaptado, há algumas leves explicações sobre o título, sobre como as personagens viajam. O filme, porém, parece crer que qualquer explicação possa ser maçante ou prejudicar a trama e não a entrega ao espectador.

Alguém poderia alegar que, já que a produção é voltada a crianças de 8 a 12 anos, não é necessário dar respostas ou explicar. Só é preciso aceitar que o fantástico está lá. Contudo, fazer um enredo de ficção científica bem coerente e com uma ótima estrutura é possível. Podemos ir da mais recente trama de Stranger Things ao clássico Doctor Who, que se sustenta falando de pontos complexos de Física para diversas gerações em mais de 50 anos na TV e ainda com baixo orçamento, sendo a prioridade do seriado britânico o público infantil. Ou seja, é possível abarcar diferentes gerações sem deixar de entreter com temáticas complexas.

Uma Dobra no Tempo pega emprestado os fatos do livro, insistindo demais em frases já muito utilizadas no gênero, como “o amor é a frequência” ou que o amor é um elemento universal, misterioso e capaz de salvar o outro. O que o filme não faz, porém, é demonstrar como isso ocorre na proposta daquele roteiro, em particular. O teor fantástico da trama não possui coerência nenhuma, pois o longa inteiro passa a impressão de que serve dizer que qualquer coisa que ocorrer é fantástico e, por não existir, não precisa de uma explicação sequer.

O gênero fantástico, para se sustentar, precisa oferecer não apenas uma estrutura que fundamente a existência daquelas três excêntricas mulheres, mas também enfatizar a missão do herói ou da heroína, para que o espectador possa entender e se envolver com os seus dilemas. No filme, o bullying ou a dificuldade que se tem na adolescência com a autoestima são mencionados, sem que se apresente, em cenas mais simbólicas, o peso daquele drama para o seu personagem. Quando essas cenas ocorrem, parecem apenas escolhidas como clichês, e não pelo sentimento lá proposto. Acabamos aceitando os sofrimentos da pequena Meg mais pela boa atuação que a atriz oferece do que pelo texto.

A direção também possui cortes abruptos que acabam sendo prejudiciais para a constituição desse mundo fantástico: não se cria tensão alguma quando a primeira das três mulheres aparece na casa de Meg, indo de uma personagem a outra com um corte que dá uma sensação muito forte de ausência de nexo na transição. Isso dificulta demais compreender como pode ser fascinante, para aquelas crianças, se deparar com essas mulheres e o que elas significam para o universo.

O ritmo do filme também acaba sendo incongruente. Pouco é dado ao espectador para entender o porquê daquelas etapas de desafio, para a protagonista, e visualizar um sentido nesse mundo fantástico. Em geral, parece que foram utilizados elementos comuns ao gênero fantástico sem tentar conceder algo original à estrutura clássica. Pouco a pouco somos levados ao fim, que é anticlimático. A qualidade da produção reside mais nos efeitos especiais bem executados e no elenco infantil, que tem seu encanto e talento.

Sendo assim, fica a dúvida se as crianças irão se encantar com os personagens e seguir, com eles, nessa jornada, pois o longa não consegue ter forças para fascinar o público adulto. Por isso, Uma Dobra no Tempo possuía o potencial de ser uma ótima trama scifi para o público em geral, mas que ao fim se torna uma aventura morna e inconsistente sobre o universo.

por Marina Franconeti – especial para CFNotícias