Crítica: O Sequestro do Papa
Resquícios de uma declinada Inquisição, que permeou por anos as mentes e os corações do Alto Clero da Igreja Católica, que se desentendiam em largar o poder que ora lhes pertencia, desencadearam as atitudes, provindas de autoritarismo, que levou um garoto judeu a ser arrancado brutalmente de sua família e tradições religiosas.
No passado, quando Anna Morisi (Aurora Camatti), empregada da família Mortara, desrespeitosa, inconsequente e secretamente batizou o adoentado – e ainda bebê – Edgardo Mortara, não imaginava que afetaria seu destino e o de seu família, de maneira drástica.
Anos depois, essa informação foi vendida e, por imposição do Papa Pio IX (Paolo Pierobon), através de seus militantes sacerdotes, Edgardo (agora interpretado por Enea Sala) tem que dar adeus a seus familiares e costumes, para desespero de sua mãe, Marianna Mortara (Barbara Ronchi), infortúnio de seu pai, Momolo Mortara (Fausto Russo Alesi), e tristeza de seus irmãos.
Essa injustiça leva a vários questionamentos. Em muitos momentos parecia que o problema era a mudança brusca, e sem opção, da religião do filho. Outros que a dor era pela ausência do mesmo.
Houve um grande engajamento entre as famílias judaicas, seus líderes e associações, para resgatar Edgardo, mas sem sucesso. Pois, mesmo que decadente, o poder da igreja católica era maior.
“O Sequestro do Papa” (Rapito) traz à tona questionamentos do passado, que permanecem, de certa forma, presentes ainda nos dias de hoje, como intolerância religiosa, autoritarismo, desrespeito à pessoa, preconceitos, entre outros temas e visões.
É um filme muito bem cuidado, prende a atenção, sem causar euforia ou ansiedade. Quem conhece e se interessa por história, sentirá uma permanente indignação. Talvez este seja o elemento que nos faz seguir, sem perceber o tempo passando, até o final, à espera de justiça.
Com o passar dos anos, num futuro tão desejado, justiça foi feita, mas eis a questão: justiça para quem? Para a família de Edgardo (nesta fase vivido por Leonardo Maltese)? Para o próprio jovem? Para a sociedade?
Edgardo está feliz com sua vida e história. E estas foram definidas por um crime, para ele isso não conta, afinal, era muito novo para ter o discernimento sobre o certo ou errado.
Para a família, era importante vencer a atrocidade, a fim de ter alívio diante da indignidade de anos. Para a sociedade, importava o espetáculo, como sempre. Mas, o maior desafio agora, para os Mortaras e Edgardo, era enfrentar o desconhecido.
Inspirado numa história real, “O Sequestro do Papa” tem direção de Marco Bellochio, roteiro de Susanna Nicchiarelli, Marco Bellochio, e colaboração de Edoardo Albinati e Daniela Ceselli.
por Carlos Marroco – especial para CFNotícias
*Título assistido em Cabine de Imprensa Virtual promovida pela Pandora Filmes.