“Karatê Kid: Lendas” (Karate Kid: Legends) marca um ponto de virada não apenas para a icônica franquia que atravessa gerações, mas também para a forma como histórias de artes marciais são contadas dentro do grande circuito hollywoodiano.
Com a difícil missão de unir o legado dos clássicos dos anos 1980, o sucesso contemporâneo de “Cobra Kai” e a demanda por uma narrativa fresca, o filme não apenas cumpre sua proposta, ele a supera.
Ben Wang brilha como Li, o verdadeiro protagonista da história. Diferente de produções que usam personagens jovens apenas como ponte para ícones do passado, “Karatê Kid: Lendas” coloca o personagem no centro de tudo, com um arco dramático bem construído e emocionalmente cativante. O ator não só entrega uma performance sólida nas cenas de conflito pessoal, mas também convence plenamente como um artista marcial. Seu domínio físico e expressividade corporal tornam suas lutas frenéticas e críveis.
Outro destaque do longa é o relacionamento entre Li e Mia (Sadie Stanley), que se revela o mais bem desenvolvido romance da franquia até hoje. Ao invés de apelar para clichês ou conexões instantâneas, o filme constrói com delicadeza uma amizade que evolui organicamente para algo mais, conferindo peso emocional real à narrativa. Mia, por sua vez, não é mero suporte romântico: junto de seu pai Victor (Joshua Jackson), ambos possuem tramas próprias que se entrelaçam de forma significativa com o arco principal, enriquecendo o enredo e evitando personagens unidimensionais.
As cenas de ação, ponto historicamente fraco de “Cobra Kai”, ganham um tratamento digno de artes marciais de verdade. “Karatê Kid: Lendas” entrega sequências bem coreografadas, com acrobacias vistosas, mas ainda ancoradas na realidade, algo que será particularmente apreciado por quem já praticou alguma arte marcial. A fisicalidade dos combates é acompanhada por uma estética jovem e divertida: o uso de elementos gráficos que remetem a videogames em certas lutas traz dinamismo e aproxima a obra do público mais novo, sem comprometer a seriedade da história.
O fan service está presente, claro, seria impensável ignorar os pilares da franquia. Mas tanto o Sr. Han (Jackie Chan) quanto Daniel LaRusso (Ralph Macchio) exercem papéis coesos dentro da trama, como mentores que oferecem orientação e apoio sem roubar o protagonismo. Essa abordagem se mostra especialmente eficaz ao reforçar que a história de Li é forte o suficiente para andar com as próprias pernas, enquanto honra o legado que a antecede.
Outro ponto que merece ser celebrado é a representatividade. Pela primeira vez em 40 anos, um personagem asiático-amarelo protagoniza um “Karatê Kid”, um atraso notável, considerando que toda a mitologia da franquia gira em torno de artes marciais asiáticas. Ben Wang não apenas preenche essa lacuna histórica, mas o faz com carisma, humor, talento e técnica. É uma presença magnética que representa com dignidade e potência uma identidade antes deixada à margem dentro da própria narrativa que a inspirou.
No fim das contas, “Karatê Kid: Lendas” sabe exatamente o que quer ser: uma carta de amor à franquia e aos seus fãs, mas também uma nova página escrita com segurança e frescor. Respeita o passado, brilha no presente e prepara o futuro. É, sem dúvida, o melhor filme da série.
por Marcel Melinsk – especial para CFNotícias
*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Sony Pictures.