Crítica: Flow

A verdadeira magia do cinema reside na sua capacidade de nos tocar emocionalmente, de fazer com que sintamos algo profundo. Essa emoção, que pode surgir de maneira súbita e imprevisível, é o que torna a experiência cinematográfica única. Seja pela dor ou pela alegria, por uma risada espontânea ou uma lágrima sincera, a emoção é o que torna um filme inesquecível.

E quando uma obra consegue provocar esse turbilhão de sentimentos, especialmente aqueles que nos levam às lágrimas, ele alcança um nível de complexidade raramente visto. “Flow” (Flow), a animação letã que concorre a duas estatuetas no Oscar 2025, é exatamente desse tipo: uma obra-prima que eleva o cinema a um patamar poucas vezes alcançado.

Dirigido por Gints Zilbalodis, “Flow” conta a história de um gato que, em meio a uma catástrofe natural, se une a uma inesperada trupe de animais – um labrador retriever, uma capivara, um lêmure e uma ave-secretário – para enfrentar os desafios da sobrevivência.

No entanto, o que realmente distingue o longa de outras obras do gênero não é apenas a sua premissa ou seus personagens carismáticos, mas sim sua abordagem cinematográfica única. Em um gesto ousado, Zilbalodis optou por uma animação sem diálogos, sem expressões humanas e, surpreendentemente, sem o uso de um storyboard tradicional. O resultado é um filme que comunica sua narrativa de forma visceral, através da ação e da reação dos animais, em um mundo repleto de detalhes visuais impressionantes.

A beleza reside não apenas no seu roteiro, mas na sua execução técnica. Produzida inteiramente no Blender, a animação é uma verdadeira obra de arte digital, onde cada animal tem sua própria identidade expressiva. A equipe, composta por apenas alguns poucos membros, consegue transmitir uma riqueza emocional que, sem palavras, faz o público se conectar profundamente com a jornada de seus protagonistas.

A ausência de falas – algo que remete aos filmes de Jacques Tati, mestre da comunicação não verbal que serviu de inspiração de acordo com o próprio diretor – torna a história ainda mais poderosa, pois é através dos gestos e olhares dos personagens que somos levados a compreender seus sentimentos, suas lutas internas e suas vitórias.

Não é por acaso que “Flow” já conquistou o Globo de Ouro 2025 de Melhor Animação. A narrativa, contada sob a perspectiva do gato, explora uma gama de emoções universais – medo, coragem, esperança, perda – que, de maneira quase poética, reflete aspectos da experiência humana. O filme é uma verdadeira celebração da animação como forma de expressão artística e um exemplo de como um pequeno time, sem grandes orçamentos, pode criar algo monumental.

Em um cenário cinematográfico saturado de franquias milionárias e histórias muitas vezes superficiais, encontrar um filme como esse é como descobrir uma joia rara em meio a um mar de produções comerciais. Não se trata apenas de uma animação para crianças, mas de uma obra que deve ser apreciada por todas as idades. A profundidade de seus temas e a riqueza de sua execução visual fazem dela uma experiência cinematográfica que, sem dúvida, ficará gravada na memória de quem a assistir.

É impossível assistir ao longa sem ser tocado. A beleza silenciosa e sua emotividade visceral o tornam uma obra fundamental para todos os amantes do cinema. Em cada cena, em cada olhar trocado entre os animais, a trama nos lembra que a verdadeira arte transcende palavras e que a emoção, quando genuína, pode ser sentida de maneiras inesperadas.

“Flow” é uma animação que vai muito além da simples diversão: é uma experiência que exige ser vivida com um olhar atento e um coração aberto. É emocionante, profunda e contempladora. Impossível não se emocionar.

Obs: Aproveitando a merecida visibilidade do Gato Preto, pense em abrir seu coração para um amiguinho felino. Na @adoteumgatinho tem vários queridos esperando por um lar cheio de amor para chamar de seu.

por Artur Francisco – especial para CFNotícias

*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Mares Filmes e Alpha Filmes.