Crítica: A Espiã Vermelha
Houve uma época extremamente dura na História da humanidade: entre 1939 e 1945 na Segunda Guerra Mundial, dois grupos de países se confrontaram. Em uma dessas alianças estavam Grã Bretanha, Estados Unidos e Rússia. Na outra, o líder foi a Alemanha nazista. Os quatro competiam de maneira acelerada para fabricar uma arma absolutamente destrutiva: a bomba atômica.
É sobre essa base que é construída a trama de “A Espiã Vermelha” (Red Joan) e que incursiona pelo romântico, o dramático e o policial.
A primeira cena oferece um dos momentos mais graves para a vida de uma pessoa: a polícia (neste caso em Londres, no ano 2000) comunica à protagonista que está detida. A acusação vai ser muito pesada: traição à Pátria. Depois, já nas primeiras sequências parece que o relato vai caminhar por um terreno denso – esse da política em meio de duas guerras, a Civil Espanhola (1936-1939) e a Mundial, já mencionada.
Mas a suspeita é que será feito de modo superficial, não transcendente, leve, só romântico, com namoricos leves. Banalizando os aspectos mais sérios e densos das lutas políticas e bélica, apresentando a ideologia só como uma camada sem raízes. (Por citar um exemplo remoto: isso aconteceu em 1983 com “Reds”, estrelado e dirigido por Warren Beatty, que dilapidava a revolução soviética, trazendo uma visão tênue e “lavada” de acontecimentos historicamente marcantes).
Por sorte, nada disso acontece aqui: o tratamento dos conflitos pessoais, misturando-se com a política partidária e internacional, resulta muito bem elaborado, em diversos planos. “A Espiã Vermelha” nos coloca diante de perguntas agudas, conflitivas: Como não sucumbir ante as próprias emoções e inclinações que traz o amor? Como não misturar as paixões amorosas e sexuais com a ideologia e os interesses da política? Haveria neutralidade na ciência? Deve-se respeitar sempre a fidelidade ao próprio país ou existiriam algumas exceções?
O filme vai crescendo em dramatismo e até nos aspectos policiais e jurídicos. O núcleo está, justamente, no caráter secreto das investigações científicas sobre a fissão nuclear, ou seja, a fabricação da bomba atômica, que determinará o curso da guerra. A protagonista precisamente trabalha na Inglaterra, nesse complexo campo.
Sua decisão final vai trazer enormes tensões e uma justificativa que faz pensar e repensar se é autêntica, correta ou apenas uma espécie de álibi diante dela mesma e dos outros.
A protagonista deste filme é Judi Dench, a veterana atriz inglesa de 84 anos de idade, com 127 trabalhos a partir de 1959 (51 em longas-metragens nos quais a partir de 1995 representou a M, a chefe de James Bond), séries de TV e até videogames.
Sua atuação, como a espiã britânica que trabalhou para os russos na Segunda Guerra, é muito boa. Com gestos mínimos, sutis, e calma própria da idade, mas tudo realizado de maneira cuidadosa, consegue transmitir e também dissimular emoções.
Porém, há outra atriz que desempenha uma tarefa excelente. Trata-se de Sophie Cookson, bem mais nova (29 anos) e menos experiente (só 4 títulos prévios). Ela representa a espiã quando jovem. Passa a impressão de ser sexy, humana, com algumas dúvidas e, ao mesmo tempo, com algumas certezas definitivas. Tudo, ensamblando-se com a etapa da maturidade e velhice, representadas por Judi Dench.
Os itens técnicos estão em um nível competente, próprio de profissionais muito experimentados; por exemplo a fotografia de Zac Nicholson, a música de George Fenton e a edição de Kristina Hetherington.
Por todos os elementos aqui enumerados, e provavelmente outros que o espectador poderá identificar, “A Espiã Vermelha” é um filme com conteúdo, que merece ser assistido.
por Tomás Allen – especial para CFNotícias