Crítica: Emily


O mundo da literatura em geral tem, como uma de suas principais características, a incrível capacidade de renovar-se sem cessar, abrindo espaço para os mais diversos gêneros e, ocasionalmente, dando visibilidade a autores que marcarão seus nomes para sempre. Emily Brontë é um desses nomes.

Interpretada por Emma Mackey em “Emily”, a autora de “O Morro dos Ventos Uivantes” – sua única obra publicada – faleceu jovem, aos 30 anos, em decorrência de uma pneumonia. O drama biográfico escrito e dirigido por Frances O’Connor nos mostra um pouco de sua curta vida e faz o público imaginar o quanto a literatura mundial perdeu / deixou de ganhar com sua precoce partida.

Para a protagonista, sobravam as parcas opções aceitas e ofertadas para mulheres na época em que a trama se passa, em 1848: casar-se e assumir as funções básicas de uma dona de casa ou trabalhar com magistério, mesmo que não houvesse interesse ou aptidão para tal.

Mas, Emily é muito mais do que a sociedade quer impor. Secretamente, a jovem escreve poemas (que, nunca ganharam a luz do dia, uma vez que foram queimados, após sua morte) e aos poucos vê o desejo de tornar-se escritora tomar conta de seu coração.

Assim como se deixa levar por uma primeira e inesperada paixão por William Weightman (Oliver Jackson-Cohen), novo reverendo que chega à cidade de Haworth, onde se passa a narrativa. A aproximação dos dois tem como justificativa, aulas particulares de francês, mas logo um sentimento maior os domina, ainda que não seja algo tão simples de lidar, frente a uma sociedade que intimida e condena.

É essa relação, com todos seus altos e baixos, alegrias e frustrações, que servirá de inspiração para Emily escrever sua obra-prima, até hoje considerada um dos livros mais relevantes já concebidos – e que, surpreendentemente, vendeu apenas dois exemplares com a autora em vida. Ao colocar seus sentimentos de maneira tão verdadeira no papel, ela conseguiu imortalizar sua história.

O longa tem êxito pleno ao recriar a época retratada, com riqueza de detalhes em figurinos e cenografia. O clima sempre úmido e chuvoso do Reino Unido e a consequente sensação de tristeza que paira no ar também são bem representados em tela. Tal impressão fica ainda mais evidente em contraste com a presença da protagonista, que consegue iluminar a tela e o ambiente a cada aparição, simplesmente por ser quem é, apesar de tudo e todos.

Em dado momento da produção, após a leitura do texto original de “O Morro dos Ventos Uivantes”, Charlotte (Alexandra Dowling) – irmã mais velha de Emily – afirma que a história trata de pessoas desprezíveis, que só se preocupam consigo mesmas. Tal frase também parece se encaixar com o mundo atual em que vivemos. Mas, é reconfortante imaginar que, em algum lugar, pode haver uma alma livre – vista por muitos como “estranha” – e que tem plena consciência da importância de não ser apenas mais uma na multidão.

Vale conferir.

por Angela Debellis

*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.